sábado, 28 de abril de 2012

Reflexões a partir do filme Milk

Acabo de assistir ao fillme "Milk", que relata a história real do político e ativista gay Harvey Milk. Um relato comovente, filme excelente e uma visão maravilhosa do mundo da perspectiva do ativista e dos gays. Não gosto de me referir a ninguém como um grupo, "os gays", "os goianos", "os católicos", "os deficientes"... para mim todos nós somos únicos, mágicos, vivendo em um mesmo planeta e no mesmo barco de dificuldades, crescimento e encantos, mas usei o termo por conta do filme.
O filme despertou em mim reflexões diversas a respeito de pessoas que, como eu, encontram-se em menor número de semelhantes na sociedade e sobre a dificuldade que é conseguir se fazer ver como igual e, ainda assim, com necessidades diferentes.
Hoje passei por uma experiência única: há anos uso muletas (uma ou duas) para me locomover por conta de uma prótese à qual não me adaptei e uma pele de coto delicada por conta da queimadura que sofri na infância e me fez perder os dois pés. Recentemente, com as bênçãos de Deus e milagres da tecnologia, consegui novas próteses pelo SARAH, às quais, na atual condição que me encontro financeiramente, jamais poderia custear. Tenho ido treinar semanalmente e estou experimentando novamente a liberdade de não precisar das muletas. Inenarrável liberdade e plenitude para mim, pois isso também significa que não estou sentido dor ao andar, o que muda completamente tudo à minha volta.
Bem, há anos, portanto, para onde vou enfrento a mesma dificuldade de andar com dor e o desconforto de caminhar com muletas, visivelmente portadora de deficiência física e necessidades especiais.
Hoje fui a diversos lugares sem as muletas e com um andar mais perto do "normal". O que não esperava, sinceramente, era notar uma diferença real na maneira como as outras pessoas lidariam comigo! Foi uma experiência curiosa... senti diversas pessoas com as quais convivo diariamente (com quem não convivo também) lidarem de forma diferente comigo, não sei bem explicar ainda, pois é muito recente, mas era como se agora eu fizesse um pouco mais parte de seu mundo, senti-me incluída, claro, o que é um bom sentimento, mas me fez refletir também sobre a questão da exclusão com a qual lidava de forma velada diariamente... e sei que com uma pessoa gay, exceto entre gays, também é assim.
Todos, pelo menos a maioria, tratamos todos com carinho e compreensão, mas não percebemos como, secretamente, de forma velada, deixamos que questões físicas e preferências sexuais nublem relações mais profundas com pessoas diferentes de nós. Claro, todos temos preferências, e não estou instigando nenhum espírito de constrangimento, o que seria ainda mais falso, ninguém gosta de todo mundo, mas deixo a reflexão para quem deixa de se aprofundar na relação com alguém gordo, gay, deficiente, religioso, mundano, ou de outra nacionalidade porque contém obstáculos sociais ou físicos, mesmo adorando aquela pessoa, merece atenção.
Sim, se relacionar com deficientes faz com que tenha que ajudá-los nos obstáculos físicos de sua vida; Sim, relacionar-se com gays significa enfrentar olhares preconceituosos de quem não sabe nada da amizade profunda que os une, e por aí vai, mas que relações verdadeiras não têm preço e que todos deveríamos ter direito a esta profundidade de relacionamento, enquanto ainda pulsamos, ah, isso com certeza!

4 comentários:

  1. Amiga,

    Que grande passo poder andar sem dor!
    Fiquei imensamente feliz por ti.
    Essa parte do olhar diferente, pra mim- mesmo sabendo que é real-é difícil de entender, pois eu não vejo deficiência em você. literalmente, eu só fui perceber que não tinha os pés porque me falaram, rsrsrsrs...
    Vejo e entendo as necessidades que você têm. mas sinceramente, isso é nada perto do que você faz!

    Beijo

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  2. Você é uma dessas pessoas raras que se conectam com quem as pessoas realmente são e rega o jardim da amizade com muito carinho, deixando florir abundantemente. Esse é só um ponto de vista de milhares de pontos de vista, sem esquecer tudo de bom que tenho e vivo, todas as superações e conquistas. Beijos!!!

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  3. Solzinha,
    você escreve muito bem. Leio tudo com muito prazer e certamente vou compartilhar este texto!
    Esta situação de lidar com as diferenças abrange situações que todos passam um dia e não percebem.
    Vivi isto, fortemente, na universidade. Explico: em plena ditadura militar, década de 70, resolvi cursar a faculdade de Filosofia. Fui discriminada pela família. Como a Bel, tão boa em matemática, não foi cursar engenharia ou informática? E o que a Bel faria com seu curso. Como vai sobreviver se a Filosofia foi banida das escolas?
    Quando apresentava algum seminário na faculdade era novamente discriminada. Meus colegas ficavam de gozação. Eu era considerada "Zen", diferente! Porque já era professora de yôga, vegetariana e ainda estudava astrologia, do-in e me preocupava com ecologia e poluição.
    Eu levava na brincadeira, sempre tive uma boa auto-estima!
    Me lembro de ter comentado na frente da turma que o que mata o homem é sua ignorância!
    1)Não sabe e não quer aprender.
    2)Se sabe, não quer ensinar.
    3)Quando ensina, ensina o que não sabe!
    Se nosso grupo de estudantes universitários (Filosofia, História e Sociologia) que representava, na época, uma elite intelectual, na alienação que o governo militar se esforçava em manter. Como? Justamente este grupo, que já era marginalizado pela sociedade, tem uma atitude preconceituosa com outras filosofias, só porque desconhece seus princípios?
    E assim caminha a humanidade...Desde então vejo isto se repetindo sempre!
    Adorei seu texto porque você soube colocar muito bem sua experiência. Tão nobre e rica em sentimentos!
    Bjos, te amo muito!

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    1. Bel, que lindo o SEU relato! Maravilhoso partilhar e encontrar no coração de outras pessoas reflexões afins e novos pensamentos para ampliar os horizontes de nossa existência. Obrigada por acompanhar meus relatos sinceros e a cada dia aumenta minha vontade de te reencontrar. Também te amo muito!

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